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terça-feira, 6 de junho de 2017

Espaço dos elementos

Adilson Roberto Gonçalves (*)


Em matéria recente no jornal Folha de S. Paulo, um deputado federal de origem militar defendeu a exploração comercial de uma reserva indígena específica, que, segundo ele, possuía enorme riqueza mineral, contendo todos os elementos da tabela periódica. Como exemplo, citou ouro, nióbio, diamante e bauxita, segundo o publicado. Sem adentrar a questão política envolvida, o parlamentar incorreu em erro comum de confusão de conceitos científicos que acabam por dificultar o entendimento da aplicação desses materiais. No caso, apenas ouro e nióbio são elementos químicos, apensar de diamante poder ser entendido também como um elemento, por ser a forma alotrópica (outros arranjos atômicos, com diferentes propriedades) do carbono, tal como o grafite. Mas bauxita, definitivamente não, uma vez que é um minério composto principalmente de óxido de alumínio (o alumínio, sim, é um elemento e um metal).

Oxigênio, hidrogênio, nitrogênio, cloro, flúor são substâncias simples (formadas apenas por um tipo de átomo) na forma de gases, mas também são os nomes dos elementos químicos dos quais aquelas substâncias são constituídas. Mesmo nome, coisas diferentes, confusão formada. A imprecisão se dá até entre os químicos, pois é muito comum, em livros didáticos, a referência a elemento e substância simples como equivalentes.

Na palavra “para”, as duas letras “a” não podem ser confundidas com o artigo definido “a”, ou com o pronome demonstrativo “a”, nem com a preposição “a”. A representação gráfica é idêntica, mas as funções são muito distintas. Tal semelhança ocorre entre elemento e substância que, longe de ser uma curiosidade ou assunto exclusivo de exames vestibulares, é fundamental para o estabelecimento de propriedades, de estudos de engenharia, de avaliação de seus custos, e, em última análise, da economia, que parece ser a força diretriz de quase tudo que se faz ou que se quer fazer.

Essas confusões e imprecisões adentram o noticiário, não apenas a mencionada fala do representante do povo. O jornalista busca as melhores palavras para o entendimento e clareza do texto, com fluidez da leitura e da mensagem. O cientista busca a exatidão dos conceitos. Um não necessariamente contempla os objetivos do outro, e nessa área cinzenta entra o jornalismo científico. No passado, esse campo foi muito bem coberto por José Reis, um cientista e jornalista divulgador da ciência, falecido em 2002, que manteve por décadas uma coluna no jornal da capital paulista. Hoje há um prêmio anual que leva seu nome, mas a divulgação científica ficou longe dos espaços, tanto o tridimensional de nossa existência, como o bidimensional dos textos impresso, e o virtual da mídia moderna.

Marchamos pela ciência no mês passado, reivindicando uma melhor aceitação e compreensão dos fatos científicos que definem nossas inter-relações com o ambiente, notadamente o aquecimento global. Também denunciamos cortes de verbas, desprestígio da atividade de pesquisa, mas não conseguimos comunicar bem o que é a própria ciência.

Não apenas os elementos químicos precisam ter o seu devido espaço: a ciência também.



(*) Adilson Roberto Gonçalves, doutor em química pela Unicamp, livre-docente pela USP e pesquisador da Unesp em Rio Claro-SP

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