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quarta-feira, 3 de julho de 2013

Economista fala ao Salvador Notícias

Para economista, manifestações populares marcam uma nova etapa no diálogo entre governo e sociedade

É natural da ocorrência de um processo histórico deixar marcas. Umas passam com o tempo, logo são esquecidas com o passar de algumas horas; outras, no entanto, ficam e mudam definitivamente o curso da história. Na história do mundo moderno, inúmeros são os fatos e acontecimentos em que é possível fazer esse tipo de leitura. Para o economista Marcus Eduardo de Oliveira, especialista em Política Internacional, com mestrado em Estudos da América Latina, pela Universidade de São Paulo (USP), os movimentos e as manifestações populares que ainda tomam conta do Brasil marcam para sempre uma nova etapa no diálogo estabelecido entre o Estado e a sociedade. Para saber a repercussão e o impacto futuro dessas manifestações, o SALVADOR NOTÍCIAS entrevistou, por e-mail, o professor de Teoria Econômica do UNIFIEO e da Faculdade de Ciências da FITO, ambas em São Paulo. A seguir, a entrevista completa:

Salvador Notícias – Que análise pode ser feita das manifestações populares que tomam conta das principais capitais e de várias outras cidades brasileiras?
Marcus E. Oliveira – A primeira e mais paulatina conclusão é que houve uma forte pressão popular sobre o governo. Isso pegou o Palácio do Planalto de surpresa, pois sempre a população brasileira, no que toca a sua forma de se mobilizar, foi subavaliada. Esse movimento, com toda essa pressão popular, é inédito na história moderna desse País. Desde a volta da democracia, talvez essa manifestação seja a mais emblemática em termos de reafirmar os princípios e valores democráticos. É marcante que isso tenha sido encetado no seio de uma juventude que cansou de viver de forma sufocada, calada e agora resolveu dar um grito de indignação. Estão dizendo que “o monstro acordou”. Penso que não. O que aconteceu é que a indignação transbordou. Ou seja, todos nós nos cansamos dos desmandos de uma classe política que, salvo raras exceções, não tem (nunca teve) compromisso para com a próxima geração, mas, sim, para com a próxima eleição. Acima de tudo, penso que esse é o movimento dos indignados. Refiro-me a uma indignação geral, ampla, contra os aumentos de tarifas públicas, contra salários e privilégios de deputados e assessores parlamentares, contra os Renans, Sarneys, Lulas, FHCs, Dilmas e Marcos Felicianos da vida. No fundo, é uma indignação de quem não aceita um aumento de tarifa pública sem a devida clareza e transparência, por sinal, transparência é algo que não é comum nas demais ações que vem lá de Brasília. Portanto, essa é uma indignação carregada de inconformismos múltiplos de quem não aceita mais viver num país cujos privilégios de uma elite dominante, e de uma classe política privilegiada, se sobressaem exponencialmente, ultrajando a maioria da população que sente na pele o drama de viver num país desigual. Na verdade, todos esses fatos contribuíram sobremaneira para assustar os governantes. O melhor disso é que, doravante, sempre haverá pressão popular sobre o governo. De tal forma que esse movimento faz surgir uma nova etapa no diálogo estabelecido entre o Estado e a sociedade. A consequência permanente dessa mobilização é que a juventude uma vez mais está se colocando na pauta da agenda do governo. Em geral, a juventude, em toda sua amplitude, nunca foi devidamente contemplada nas políticas governamentais. Isso muda a partir de agora. Definitivamente, o governo passa a olhar de forma diferenciada para a vida urbana, para a vida na periferia, para os anseios dos mais jovens, de quem bate no peito e põe a cara na rua para gritar por seus direitos. O que esse movimento mostra, aliado e consubstanciado ao domínio e penetração das redes sociais, é que as muitas falcatruas por parte daqueles que estão (e exercem o) no poder podem estar com os dias contados.

SN – O governo federal, em especial, ficou refém dessas manifestações populares?
MEO – Não só ficou como de fato está. O governo federal, em especial, mas penso que isso também serve para cada prefeito e, no todo, para cada “representante do povo”, terá que repensar seriamente sobre as formas de dialogar com a classe popular. Se os atuais governantes querem “sobreviver” politicamente falando, penso que chegou a hora deles descerem do altar sagrado em que cotidianamente se escondem. O diálogo com o povo não pode mais ser estabelecido de quatro em quatro anos, às vésperas das eleições, por meio dos enfadonhos programas eleitorais em cadeia nacional de rádio e TV. Essas manifestações nas ruas evidenciam e clamam por mudança nesse sentido. Se diante disso tudo o governo ainda não aprendeu algo está perdendo uma grande oportunidade de entender o que realmente se passa nas ruas. Gostaria de reafirmar também que a própria população se deu conta, de uma vez por todas, daquilo que os intelectuais sempre disseram: que o verdadeiro poder está embutido no povo e com o povo, que é ali, no seio das camadas populares que reside a maior e mais sintomática força política. Historicamente, a classe política brasileira sempre olhou para o povo com certo desdém e, de certa forma, sempre o subjugou. É claro que isso acontece de forma velada, mascarada, afinal, eles (os políticos) sempre souberam disfarçar bem, sempre se “maquiaram” e vestiram a máscara da falsidade e da desfaçatez. Os programas políticos veiculados em TV, em época eleitoral, mostram isso claramente, basta ter um pouco de percepção para notar tamanha desfaçatez. Os marqueteiros profissionais sabem como ninguém explorar isso. O fato primordial desse amplo movimento popular é que, de certa forma, acaba desnudado isso tudo. Sempre prevaleceu no imaginário dos políticos o sentimento de que o povo não sabe votar e de que pode facilmente ser convertido em massa de manobra. Não quero entrar no mérito dessa questão. Mas, inequivocamente, essas manifestações populares mostram que de bobo o povo nada tem. Pode até não saber sobre ideologia ou formação político-partidária, mas sabe muito bem aonde o calo aperta. E os governantes sempre trataram isso com certo menosprezo. Isso explica o movimento ter “engrossado” com o passar dos dias. O que começou como uma reação à elevação da tarifa do transporte público foi logo ganhando novas pautas. Aí está um nível de reclamação bem estruturado. Não estranhemos se, em breve, algumas figuras-chave da política brasileira começarem a ser destituídas de seus cargos. O movimento se encaminha nessa direção. E não há nada mais emblemático para fortalecer a democracia do que destituir quem não vem exercendo adequadamente seu papel.

SN – Então, no fundo, essas manifestações públicas mostram uma mudança de atitude da sociedade em relação à atuação dos governantes?
MEO – Mais do que uma mudança de atitude, de paradigma mesmo, todo esse movimento enlaça um conjunto de conquistas pontuais. Reitero o que disse antes: do lado da classe política, quem quiser “sobreviver” politicamente terá que ser muito, mas muito transparente e verdadeiro em suas ações, em projetos e atitudes. A população está e estará de olho bem aberto. É importante salientar, nesse aspecto, o papel que as redes sociais têm exercido, auxiliando no aparato de fiscalizar, cobrar, exigir e impor novas demandas. Isso é outro fato a favor da população que a classe política não contava.

SN – É possível descrever os desdobramentos dessas manifestações em termos de conjuntura econômica e política?
MEO – É muito difícil captar todas as projeções e dimensões futuras desse cenário. O sentimento que fica é que algo precisava ser feito pelo povo, e foi. Se havia um único fato que todo e qualquer governante mais temia, esse fato é o povo nas ruas cobrando direitos e exigindo transparência e decência por parte do poder público. Se analisarmos com calma alguns dos vários cartazes levantados pelo país afora, vamos perceber que a maioria deles está pedindo, essencialmente, decência na política, respeito com a coisa pública. Decência na política e respeito com a coisa pública é usar com qualidade o dinheiro que pagamos em impostos, é combater com rigor e firmeza toda e qualquer prática de corrupção, de desperdício, de malversação do erário público, é não admitir, entre tantos outros fatos, a incidência de privilégios e de desmandos de parlamentares e do executivo em geral. 

Salvador Notícias

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