Entre
as sessões do tratamento na Clínica de Hemodiálise Senhor do Bonfim, na
Cidade Baixa, alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA) da rede
municipal de ensino falam de experiências e sentimentos. E essas
histórias resultaram em uma coletânea em forma
de livro, editado pela Escola Hospitalar e Domiciliar Irmã Dulce,
sistema que atende estudantes da rede municipal regularmente
matriculados e que, por conta de alguma enfermidade estejam
impossibilitados de assistirem às aulas no dia a dia, e que não querem
perder o ritmo de ensino, mesmo estando hospitalizados.
A coordenação da iniciativa ficou sob a responsabilidade da professora
Zenaide Malaquias, da Escola Municipal Hospitalar, que escutou cada
história e procedeu com a edição do trabalho. “Contar uma história ou
pedir para os alunos recontarem, por meio de um
desenho ou da oralidade não seria o suficiente. Por isso, sempre antes
de começar a aula, procuro saber como foi o dia deles. Dessa forma, além
de professora me torno amiga, companheira, alguém que eles confiam. E
foi assim que tive a ideia de fazer o projeto
a partir da história de vida de cada um deles”, explica.
A iniciativa é voltada a alunos da EJA, na faixa etária de 40 a 75 anos,
e ocorre entre duas e três vezes por semana, quando ocorrem as sessões
de hemodiálise. De acordo com a professora, muitas vezes, as pessoas não
estão bem física e nem psicologicamente,
em consequência do procedimento médico. “Percebi que quando abro para
eles me contarem sobre como estão se sentindo, sempre contam casos da
vida deles, trazem comparações com coisas do passado. Foi ai que percebi
que falar da própria vida os atraía para a
aula”, prossegue a educadora.
Método - As histórias contadas foram redigidas por ela exatamente
do modo que os alunos falavam. “Sentei com cada um dos alunos para
fazermos a correção em relação à pontuação gramatical, construção
textual e tudo mais. Teve aluno que só contou uma,
enquanto outros chegaram a me falar até quatro histórias. Depois esses
relatos começaram a circular entre os demais alunos da turma. E foi
através dessas narrativas que também fomos trabalhando interpretação,
gramática, substantivos masculino e feminino, plural,
singular, classificação de palavras quanto ao número de sílabas, bem
como gráficos, distância, tempo, temperatura, dentre outros”, detalha.
A coletânea das histórias foi lançada na Mostra Pedagógica 2018,
ocorrida no mês de outubro. De acordo com a coordenação da ação, o nome
de cada aluno consta em uma página que abre a coletânea, mas nas
histórias não há qualquer identificação para que eles não
se sintam constrangidos, já que cada aluno irá receber, no final do ano
letivo, um exemplar da publicação.
Lindaura Paula dos Santos, 60, aluna da instituição, faz hemodiálise há
um ano e é um exemplo dessa esperança despertada pelo projeto. Ao chegar
à instituição ela mal sabia ler. “Foi muito bom contar minha história.
Tem noite, inclusive, que eu não durmo: leio,
releio... é uma delícia. Já coloquei meus filhos, marido, a vizinha,
todo mundo para ler. Eu sabia ler muito pouco, e a professora é como um
anjo para a gente”, resume.
Classes Hospitalares - A Escola Municipal Hospitalar e Domiciliar
Irmã Dulce, pioneira no país, foi inaugurada em 1º de outubro de 2015, e
é fruto do projeto Classes Hospitalares, promovido desde 2001 pela
Secretaria Municipal da Educação (Smed) em 16
instituições de saúde e casas de apoio, além do atendimento em
domicílios.
O trabalho da escola é realizado em ambiente hospitalar e domiciliar,
compostas por casas de apoio, residências e casas-lares, prestando
atendimento a crianças, adolescentes, jovens e adultos em processo de
tratamento de saúde ou internamento hospitalar. O
objetivo do trabalho é promover um processo educativo que assegure o
direito à vida e à saúde, estimulando o processo de escolarização da
clientela hospitalizada, voltada para a redução do nível de atraso
escolar e, consequentemente, a evasão.
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