Desafios e Implicações Jurídicas
Resumo: Nos últimos anos, o fenômeno dos influenciadores digitais se tornou um dos pilares mais fortes da comunicação e marketing contemporâneos. Com milhões de seguidores em plataformas como Instagram, YouTube, TikTok e Twitter, esses indivíduos têm o poder de moldar opiniões, comportamentos e até mesmo influenciar decisões de consumo. No entanto, o alcance de sua voz e a relevância de sua presença na internet trazem consigo uma série de responsabilidades legais, especialmente no que diz respeito à sua responsabilidade civil, quando de suas divulgações resultam acordos comerciais que visam lucros para o influenciador e maior possibilidade de alcance de marcas.
Palavras-chave: influenciadores digitais. Responsabilidade civil. Fornecedor por equiparação. Código de Defesa do Consumidor.
Introdução
Os influenciadores digitais atuam como as novas personalidades do mundo atual, vez que estão diretamente ligados a publicidade, marketing, propaganda, ou seja, ao mundo comercial consumerista. Isto porque, compartilham seu estilo de vida, experiencias, gostos, conquistando a atenção e consequentemente, confiança dos seguidores de forma orgânica.
Desta forma, empresas os utilizam como forma de divulgação de seus produtos e serviços, mediante ao vasto alcance de pessoas em redes sociais, infinitamente maior que meios tradicionais tais como televisão, outdoor e afins, oportunidade em que esses influenciadores podem monetizar seu estilo de vida online.
Neste cenário, imperioso se faz a necessidade de proteção desses seguidores, pois acabam se tornando consumidores do conteúdo e das divulgações realizadas, ou seja, o influenciador se equipara ao fornecedor de serviços e produtos, pois atua em evidente cadeia de consumo, e, consequentemente, acaba por serem regidos pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990), ao passo que os seguidores consomem as divulgações pela confiança gerada na relação do influencer/seguidor, servindo como o verdadeiro consumidor da relação. Por esta necessidade se fez imprescindível questionar a possibilidade de responsabilização dos influencers, pois se tratam de evidentes meios de marketing afins de dar maior alcance para as empresas e marcas sobre seus produtos e serviços. Este artigo tem como objetivo analisar as implicações jurídicas da atuação dos influenciadores digitais, discutindo os principais aspectos da responsabilidade civil, as possíveis consequências de seus atos e as medidas que podem ser adotadas para mitigar riscos legais.
Da responsabilidade civil e da relação de consumo: a atuação dos influenciadores
Responsabilidade civil é o dever de reparar danos causados a terceiros em decorrência de um ato ilícito, seja ele de natureza contratual ou extracontratual. Em outras palavras, quando alguém causa prejuízo a outra pessoa — seja por meio de ações ou omissões —, essa pessoa pode ser obrigada a indenizar a vítima pelos danos causados. A responsabilidade civil pode envolver tanto danos materiais quanto danos morais, e a legislação brasileira prevê que o infrator deverá arcar com a reparação, de forma que o lesado seja compensado adequadamente.
Sob a perspectiva do Código de Defesa do Consumidor, o art. 2º, classifica consumidor como “toda pessoa, física ou jurídica, que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final” e fornecedor, nos termos do art. 3º do mesmo diploma, é “toda pessoa que desenvolve atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”.
Também se tem o fornecedor por equiparação, conceito criado pela Doutrina, dispondo que além dos que se enqu0adram no art. 3º do CDC, também deve ser considerado fornecedor eventual terceiro que serviu como intermediário da relação consumerista principal atuando como se fosse o fornecedor.
Neste sentido, Filomeno (2018, p. 298) disserta que na publicidade figuram três personagens: o anunciante, o agente publicitário e o veículo, onde o anunciante se equipara ao fornecedor, nos termos da definição de fornecedor constante do CDC, o agente figura como o criador da publicidade e o veículo qualquer meio de divulgação, onde as redes sociais podem ser enquadradas perfeitamente, pois o conteúdo é distribuído em massa.
Por tais razões, é aceitável que o seguidor seja equiparado ao consumidor descrito no CDC, uma vez que é destinatário final da publicidade consumida do conteúdo do influencer, que é o intermediador, portanto, pode figurar na situação de fornecedor por equiparação.
A seguir, apresentamos alguns dos principais aspectos em que a responsabilidade civil dos influenciadores pode ser questionada:
Publicidade Enganosa e Propaganda Ilegal
Muitos influenciadores promovem produtos e serviços por meio de publicações patrocinadas. A prática de publicidade digital, quando mal conduzida, pode configurar publicidade enganosa, o que é proibido por lei no Brasil. O Código de Defesa do Consumidor (CDC) estabelece que o consumidor não deve ser induzido a erro sobre a natureza, qualidade ou características de um produto ou serviço, ou seja, todas as informações devem ser claras, sendo vedada a publicidade enganosa conforme art. 37, §1º do referido Diploma Legal.
Quando um influenciador faz publicidade de forma dissimulada, ou seja, sem deixar claro que se trata de um conteúdo patrocinado, ou ao promover produtos que não cumprem o que prometem, ele pode ser responsabilizado pela prática de propaganda enganosa. Além disso, a recente Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) também impõe regras rigorosas sobre o uso de dados pessoais para fins publicitários, o que deve ser observado pelos influenciadores em suas parcerias com marcas.
Disseminação de Fake News e Informações Falsas
Influenciadores, muitas vezes, têm um grande poder de disseminação de informações. Quando esses indivíduos propagam informações falsas, sem verificar a veracidade dos dados, podem ser responsabilizados pelos danos causados aos seus seguidores. A propagação de fake news não é apenas um problema ético, mas também jurídico, e pode gerar consequências graves, como danos à reputação de terceiros, prejuízos financeiros e até mesmo questões relacionadas à saúde pública.
A jurisprudência brasileira tem acompanhado essa realidade e, em casos como a divulgação de informações prejudiciais à coletividade (como fake news sobre vacinas ou tratamentos de saúde), a responsabilidade civil do influenciador pode ser ativada, levando à condenação por danos morais e materiais.
Ofensas e Discriminação nas Redes Sociais
Outro ponto importante é a responsabilidade do influenciador por discursos de ódio, discriminação ou incitação à violência. A liberdade de expressão é garantida pela Constituição, mas ela não é absoluta, e há limites quando o discurso fere os direitos fundamentais de outros indivíduos, como a honra, a imagem e a dignidade.
Caso um influenciador seja responsável por postagens que incitem ódio, racismo, homofobia, transfobia ou qualquer outro tipo de discriminação, ele pode ser processado por danos morais e também pode ser responsabilizado criminalmente, caso suas ações configurem crimes previstos no Código Penal, como injúria, difamação ou incitação ao crime.
Danos à Imagem de Marcas e Terceiros
Influenciadores têm uma relação direta com empresas e marcas, seja por meio de parcerias, seja pela associação involuntária a produtos ou serviços. Quando um influenciador se envolve em escândalos públicos, ou age de maneira irresponsável, isso pode prejudicar a imagem das marcas com as quais ele tem vínculo. Por exemplo, quando um influenciador é flagrado cometendo atos de corrupção ou uso indevido de substâncias ilícitas, ele pode afetar negativamente a reputação das empresas que patrocinam ou apoiam suas ações.
Neste contexto, a responsabilidade civil do influenciador pode envolver a reparação dos danos causados às marcas, que podem ter direito a um pedido de indenização por perdas econômicas e danos à imagem.
Como mitigar os riscos jurídicos?
Dado o grande poder de influência dos influenciadores, é fundamental que eles estejam cientes de suas responsabilidades legais. Para mitigar os riscos jurídicos, alguns cuidados podem ser tomados:
1.Transparência em Publicidade: Sempre deixar claro quando um conteúdo for patrocinado, de acordo com as diretrizes do Código de Defesa do Consumidor. Marcar claramente publicações pagas e evitar fazer promessas exageradas sobre produtos e serviços.
2.Verificação de Informações: Sempre checar a veracidade das informações compartilhadas, especialmente quando se trata de temas sensíveis, como saúde ou notícias.
3.Respeito aos Limites da Liberdade de Expressão: Evitar postagens que possam incitar ódio, discriminação ou outras práticas ilegais, promovendo um discurso responsável e respeitoso com a audiência.
4.Contratos e Acordos com Marcas: Estabelecer contratos claros com as marcas, definindo responsabilidades e limites em relação às campanhas publicitárias, evitando que a imagem do influenciador seja prejudicada.
Considerações finais
A responsabilidade civil dos influenciadores digitais é um tema complexo, que envolve uma análise cuidadosa do impacto de suas ações no mundo digital. Apesar da liberdade de expressão ser um direito fundamental, é essencial que esses profissionais compreendam que suas postagens, declarações e atitudes podem ter repercussões legais significativas. A responsabilidade por danos causados a terceiros, seja por meio de publicidade enganosa, disseminação de informações falsas ou discursos de ódio, exige uma postura ética e consciente por parte dos influenciadores, além de um acompanhamento rigoroso das leis e regulamentos pertinentes ao ambiente digital. A prática de um influenciador responsável não só protege sua imagem e sua carreira, mas também contribui para um ambiente online mais saudável e seguro para todos.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Lei nº 8078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Brasília, DF, Disponível em: . Acesso em: 21 NOV. 2024.
TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito do Consumidor: Direito Material e Processual. 5. ed. São Paulo: Forense, 2015. (Revista, atualizada e ampliada).
VALLE, Alberto. O que são influenciadores digitais. Disponível em: . Acesso em: 21 NOV. 2024.
Sobre o autor:
Karoline Bahiense Agnelli, pós-graduanda em Direito Ambiental pela Universidade de Vila Velha/ES, bacharel em Direito pela Universidade Paulista/SP, advogada associada no Vigna Advogados
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